quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Um laço vermelho pela vida e contra o preconceito

 

Uma belíssima jovem é excluída do convívio com a família e é isolada em uma casa na Região Serrana do Rio de Janeiro. Seus planos são interrompidos: o noivado, os estudos, a vida social. Ela tem tuberculose, e no fim do século 19 e início do século 20 esse era o único tratamento possível, ar puro e isolamento. Os portadores da doença eram estigmatizados socialmente, não podiam conviver com pessoas saudáveis e a sobrevivência era determinada por fatores desconhecidos. E esse medo do desconhecido causava pânico nas pessoas saudáveis que viam na doença um estigma social. Essa é a sinopse do famoso livro Floradas na Serra, imortalizado no cinema e no teatro pela atriz Cacilda Becker.
Agora, caro leitor, você pode reler o primeiro parágrafo trocando a palavra tuberculose por outra doença a sua escolha.

Imagem: Campanha de Carnaval 2011 do Ministério da Saúde. Direcionada às mulheres na faixa etária de 15 a 24 anos, das classes C, D e E.

Ao longo da história a hanseníase e o câncer já estiveram no topo dentre as doenças que marcam a fogo seus portadores: não apenas uma bactéria, um bacilo, ou um vírus. Tuberculosos eram boêmios, deprimidos, criaturas noturnas que entregavam sua vida à “melancolia pulmonar”, os abrigos de “leprosos” persistiram no Brasil até meados do século 20, eram intocáveis e muitos os consideravam os doentes amaldiçoados. Não precisamos nem contar quantas vezes ouvimos que tal pessoa “fez um câncer”, “engoliu muito sapo” e acabou “transformando a mágoa em doença”. E com os portadores do HIV não é diferente nos dias de hoje.

Infelizmente ainda não aprendemos a separar fatalidade de julgamento moral, imponderável de preconceito. Num passado não muito distante ainda se falava de grupos de risco para falar das pessoas infectadas pelo HIV. Era como se um selo fosse colado na comunidade homossexual, nos usuários de drogas, nas prostitutas e até nos hemofílicos que faziam regularmente transfusões de sangue.
A classificação em grupos de risco além de marginalizar ainda mais os marginalizados serviu para criar uma aura intocável nos famosos “cidadãos de bem”. Se você não sai transando por aí, ou tendo comportamentos socialmente condenáveis, fique tranquilo, está a salvo, jamais a Aids chegará perto de você. Basta você ficar bem longe desses “aidéticos”. E isso fez com que a epidemia se tornasse silenciosa. O estigma social fez com que muitas pessoas abrissem mão da prevenção, achando que estavam imunes.
O resultado é que anos depois da descoberta do vírus, a epidemia de AIDS está longe de ser controlada, e hoje ela atinge todas as camadas da população; se tornou democrática, atingindo diversas classes sociais e orientações sexuais. E o dado mais contundente sobre a AIDS nos últimos anos é que a epidemia avança de forma muito mais arrasadora entre as mulheres.
Os dados são do Boletim Epidemológico de 2005. De 1994 a 2004, o número de casos aumentou 175%, enquanto o crescimento em homens ficou em 29%; o índice aumenta em mulheres de todas as faixas etárias, exceto entre mulheres jovens de 13 a 24 anos.

Logo da Campanha Laço Vermelho promovida pela UNAIDS - Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS

Especialistas apontam na resistência de homens e mulheres em relações estáveis exigirem o uso de preservativo. A pressuposta monogamia e a baixa auto estima fazem com que a prevenção seja deixada de lado, como aponta a ginecologista e especialista em saúde da mulher Albertina Duarte. Mulheres acima de cinquenta anos não fizeram parte de uma geração acostumada com a liberdade sexual nem conviviam com o fantasma da doença no início de suas vidas sexuais. Muitas estão recomeçando uma vida sexual com um novo parceiro e não acostumadas as novas regras do jogo sexual acabam achando que a confiança na relação basta para protegê-las.
É sempre bom lembrar que o comportamento de risco não escolhe credo, cor, raça. É repetitivo bater nessa tecla, mas no Brasil 95% das contaminações acontecem via sexual e a única maneira de se proteger é usando camisinha. É sempre bom lembrar que apesar do coquetel aumentar a qualidade de vida, a AIDS ainda não tem cura. É sempre bom lembrar que a epidemia de AIDS é uma realidade, é presente no nosso dia a dia, que cara de saudável não garante nada. É sempre bom lembrar dessas coisas que nós fazemos questão de esquecer tão convenientemente: o HIV não é coisa do outro, do diferente. É coisa do próximo, de quem amamos, respeitamos, de quem está do nosso lado no metrô, no trabalho, em casa, na vida.
Nesse dia primeiro de dezembro, vamos lembrar do óbvio, que o laço vermelho não simboliza apenas a luta de combate à AIDS, mas é também a luta pela vida e contra uma doença muito mais perigosa, letal e difícil de combater: o preconceito.
Fonte:
Um laço vermelho pela vida e contra o preconceitoBlogueiras Feministas | Blogueiras Feministas

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